O TÁXI (Zaé Júnior)
Chofer, me leve para a rua do meu encontro
onde alguém não sabe que me espera
e um sorriso amanhece todas as manhãs
e se gasta antes do meio-dia
porque eu ainda não cheguei.
Não é que me julgue o único capaz
de perpetuar o sorriso
mas é que vou levando comigo
algumas palavras e algumas entregas
e tenho pressa de chegar antes da tarde
antes que outro transeunte sem caminho
ache o endereço antes de mim.
Mas não corra tanto
que possa assustar as crianças
nem espante os pássaros dos fios
que é através deles que enxergo o céu.
Se algum poeta atravessar a rua
breque, não ofenda seus passos
que também eles não levam a lugares
onde eu já não tenha me hospedado
ou escondido uma esperança
ou amanhecido sozinho
com o mesmo frio com que cheguei.
Mas, se for possível, corra
deforme as árvores, as casas, as pessoas
que já cansei de decorá-las
sem que se dessem por mim.
No farol, ali em frente, entre à esquerda
porque ao longo há um gato pardo
esperando ser atropelado ainda hoje.
O senhor sabe, se nós o atropelarmos
irá conosco o som do seu último gemido
e é possível que quem não me espera se espante
e feche a janela quando chegarmos.
Chofer, sei que talvez a corrida seja longa
e o trânsito seja difícil
mas eu prometo pagar-lhe trocado
e com boa gorjeta de bênçãos
porque no momento em que chegarmos
eu o farei herdeiro de todas as minhas coisas
terrenos, praias, horizontes
portões, relógios, letras de samba
que o senhor se sentirá tão rico
que já poderá se livrar da direção dos outros
e procurar como eu o seu caminho.
Chofer, chofer...
pare naquela esquina.
Tenho a impressão de que já passei por aqui.
Olhe, talvez aquela moça de braços abertos
saiba onde fica o lugar do meu encontro.
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